Vigilância Sanitária. Fiscal. Atuação. Servidor Público Intervenção. Saúde Pública. Atividade exclusiva do estado.

29/Jun/2023

Por Thiago lopes Cardoso Campos


Nota Técnica IDISA n° 003/23

Consulente: Secretária Municipal de Saúde, Iracemápolis, SP

Assunto: Vigilância Sanitária. Fiscal. Atuação. Servidor Público Intervenção.
Saúde Pública. Atividade exclusiva do estado.

Trata-se de Nota Técnica com o objetivo de prestar esclarecimentos
aos questionamentos do município de Iracemápolis/SP, no âmbito do Direito Sanitário,
acerca da atuação dos fiscais na vigilância sanitária.

I. DA ATUAÇÃO DOS FISCAIS NA VIGILÂNCIA SANITÁRIA

Questionamento 1: Se para atuar como fiscal na
Vigilância Sanitária é imprescindível que o fiscal seja um
servidor efetivo do Município.

A Lei Orgânica da Saúde, Lei Federal 8.080/1990, estabeleceu, no
artigo 15, as atribuições comuns da União, dos estados, do Distrito Federal e dos
municípios, entre as quais prevalece a de elaboração de normas técnicas específicas, de
normas reguladoras de atividades do setor privado e de normas técnico-científicas de
promoção, proteção e recuperação da saúde, a definição das instâncias e mecanismos
de controle e fiscalização inerentes ao poder de polícia sanitária, bem como, a
competência de cada uma das entidades estatais para legislar nesses campos.

Ademais, o art. 18, inciso IV, alínea b, define que compete a direção
municipal do SUS executar os serviços de vigilância sanitária.

Combinando-se as competências atribuídas a cada uma das esferas de
governo (União, estados, Distrito Federal e municípios) com as atribuições comuns e os
objetivos gerais do SUS, enunciados na Constituição Federal e na Lei Orgânica da Saúde,
e enquadrando-as no esquema de limites para o exercício dessas competências pelas
entidades estatais, verifica-se que, em matéria de Vigilância Sanitária, incluindo o poder
de polícia administrativa sanitária, os entes têm atribuições específicas, embora se
complementam.

Lado outro, no Estado de São Paulo as diretrizes da vigilância sanitária
encontram-se definidas na Lei 10.083/1998 que dispõe sobre o Código Sanitário do
Estado, determinando à Secretaria de Estado da Saúde o dever de manter atividade de
capacitação permanente dos profissionais que atuam em vigilância sanitária e
epidemiológica, de acordo com os objetivos e campo de atuação das mesmas, bem
como, organizar, em articulação com os Municípios, o Sistema de Informações em
Vigilância Sanitária e Epidemiológica.

Os municípios podem, na medida dos interesses predominantemente
locais, suprir as omissões e lacunas da legislação federal e estadual, no tocante à
aplicação e execução de ações e serviços de Vigilância Sanitária, considerando os
conceitos de organização e de planejamento das ações sanitárias integradas ao SUS,
baseados nos requisitos da gestão da qualidade, no gerenciamento do risco, perfis e
competências.

Considerando, ainda, o art. 4º, inciso IV, da Portaria nº 1139/2023 do
Ministério da Saúde, que define, no âmbito do Sistema único de Saúde (SUS), as
responsabilidades das esferas de gestão e estabelece as Diretrizes Nacionais para
Planejamento, Execução e Avaliação das Ações de Vigilância e Assistência Saúde em
Eventos de Massa, que estabelece o conceito de Autoridade Fiscalizadora Competente
como:
Art. 4º Para efeito desta portaria, são adotados os seguintes
conceitos:
IV - Autoridade fiscalizadora competente: agente público
competente da vigilância sanitária e da saúde suplementar, com
poder de polícia administrativo.

Partindo dessa premissa, é importante diferenciar o servidor público
efetivo, daqueles que ocupam cargos comissionados. O art. 37, inciso V da Constituição
Federal de 1988 dispõe que: "as funções de confiança, exercidas exclusivamente por
servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos
por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei,
destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento".

Não há uma distinção precisa entre as funções de confiança e os cargos
em comissão. A maior diferença está no lugar ocupado no quadro funcional da
Administração, sendo que, enquanto o cargo em comissão ocupa um espaço na sua
estrutura, uma vez que se nomeia uma pessoa qualquer para exercê-lo (nomeação
baseada na confiança da autoridade nomeante para com o nomeado) reservado o limite
mínimo exigido por lei, atribuindo-lhe um conjunto de responsabilidades, a função de
confiança é atribuída a um servidor efetivo, que já pertence aos quadros da
Administração, não modificando, então, a estrutura organizacional da Administração
Pública.

Desse modo, os servidores públicos, constituídos como autoridades
fiscalizadoras sanitárias, deverão ser formados, capacitados e qualificados, de modo a
atender as competências e habilidades exigidas para atender de forma adequada e
eficiente a cobertura das ações sanitárias de abrangência e de responsabilidade no
território.

Portanto, tendo em vista os dispositivos apresentados, por se tratar de
atividade exclusiva de Estado, para atuar em atividades fiscalizatórias da Vigilância
Sanitária, é imprescindível que os agentes sejam servidores públicos formalmente
investidos na função de Autoridade Fiscal, pois esse tipo de ação no âmbito da vigilância
sanitária requer o exercício administrativo do poder de polícia. Situação diversa seria,
por exemplo, o caso de um cargo comissionado de coordenação de um determinado
setor.

Questionamento 2: Se é possível que profissionais
contratados pelo Consórcio Intermunicipal de Saúde
exerçam função de Fiscal da Vigilância Sanitária.

Quanto ao segundo questionamento, deve ser analisada a questão à
luz da impossibilidade de delegação do poder de polícia exigido nas ações fiscalizatórias
da vigilância sanitária.

As autoridades sanitárias, constituídas por servidores públicos, que
compõem as equipes da vigilância sanitária e dos laboratórios de saúde pública, em
razão do poder de polícia administrativa, são investidos das funções de inspeção e de
fiscalização, assim, serão competentes para fazer cumprir as leis e regulamentos
sanitários, apurando o ilícito, realizando a colheita de amostras, expedindo termos,
autos de infração e de imposição de penalidades e outros referentes à prevenção e
controle de tudo quanto possa comprometer a saúde.

Corroborando, a Lei Federal nº. 8.080/1990 dispõe que ao município
compete planejar, organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde;
executar serviços de vigilância sanitária; formar consórcios administrativos
intermunicipais; controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços privados de saúde.
Nesse sentindo, conforme já definido na Portaria de Consolidação nº.
5, de 28 de setembro de 2017, especificamente no Anexo CII, Título I, no Capítulo II –
Das Definições – Art. 4º, inciso III, autoridade sanitária é o órgão ou agente público
competente da área da saúde, com atribuição legal no âmbito da vigilância e da atenção
à saúde.

Desta forma, existe o dever de relacionar quem de fato exerce essa
autoridade, seja em rol taxativo ou não, assim como pontuar o que a ela compete
privativamente, ou em caráter colaborativo com as demais autoridades de saúde,
especificando a forma de investidura do Poder de Polícia, de modo que um empregado
do consórcio não poderia ser nomeado como Autoridade Sanitária, em razão de não
preencher os requisitos necessários para a função. Entretanto, depreende-se a
possibilidade de contratação por meio de consórcio intermunicipal, de profissionais que
exerçam a função, exclusivamente, de oferecer suporte em caráter colaborativo a
Autoridade da Vigilância Sanitária, sem exercer o poder de polícia.

Questionamento 3: Se um profissional da vigilância pode
atuar, simultaneamente, em diversas áreas de
fiscalização na Vigilância Sanitária, exercendo suas
atribuições tanto na fiscalização de estabelecimentos de
alimentos quanto na fiscalização de serviços de saúde?

Em análise do terceiro questionamento, inexiste vedação acerca da
possibilidade de um fiscal da Vigilância Sanitária - VISA atuar, simultaneamente, em
diversas áreas de fiscalização, bem como dispõe o § 1º do art. 6º da Lei Federal nº
8080/90:

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema
Único de Saúde (SUS):

§ 1º Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações
capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de
intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio
ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de
serviços de interesse da saúde, abrangendo:

I - o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente,
se relacionem com a saúde, compreendidas todas as etapas e
processos, da produção ao consumo; e

II - o controle da prestação de serviços que se relacionam direta
ou indiretamente com a saúde.

Portanto, ao fiscal da Vigilância Sanitária é conferido poder de atuar
na fiscalização de diversas áreas com o objetivo de eliminar, diminuir ou prevenir riscos
à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da
produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde.
Entretanto, é importante que estejam estabelecidas as atribuições do
da Autoridade Sanitária, para que detenha uma atuação pautada pela perspectiva da
integralidade, equidade e universalidade do cuidado à saúde e que leve em conta as
características demográficas, econômicas, sociais e epidemiológicas do território onde
atua, de modo que é importante definir as atribuições necessárias para cada tipo de
vigilância abaixo exposta:

i) Inspeção e fiscalização de alimentos;

ii) Inspeção e fiscalização de medicamentos e insumos
farmacêuticos;

iii) Inspeção e fiscalização de cosméticos e saneantes;

iv) Inspeção e fiscalização dos dispositivos médicos
(produtos para saúde e kits diagnóstico in vitro);

v) Inspeção e fiscalização de estabelecimentos e serviços
de sangue, tecidos, células e órgãos;

vi) Inspeção e fiscalização de estabelecimentos e serviços
de saúde;

vii) Inspeção e fiscalização de serviços e estabelecimentos
de interesse à saúde;

viii) Inspeção e fiscalização de atividades e serviços
realizados por categorias e profissionais de interesse à
saúde;

ix) Gestão da Qualidade;

x) Ações de vigilância pós-mercado;

xi) Processo administrativo sanitário;

A despeito de todas essas prerrogativas, a Autoridade Sanitária da VISA
há de ser uma pessoa com conhecimento, que detenha múltiplas habilidades e, acima
de tudo, seja um líder e atue com vistas à melhoria do ambiente do trabalho, em
consonância com as políticas públicas, objetivando a saúde da população.

II. CONCLUSÕES

Portanto, em análise dos questionamentos do município de
Iracemápolis/SP, no âmbito do Direito Sanitário, no que se refere a atuação dos fiscais
na vigilância sanitária, verifica-se acerca do primeiro questionamento que, por se tratar
de atividade exclusiva de Estado, para atuar na VISA, é imprescindível ser servidor
público formalmente investido na função de Fiscal da Vigilância Sanitária, pois a ação de
vigilância sanitária requer o exercício administrativo do poder de polícia, não havendo
como ser preenchido por cargo de comissão de livre provimento (aquele que pode ser
ocupado por pessoa estranha a administração pública).

Contudo, considerando a sua natureza híbrida - agente técnico e
político - a autoridade sanitária pode ser tanto um servidor público efetivo, que pertença
aos quadros da Administração Pública, ou ocupante de cargo em comissão, de livre
designação e nomeação, não modificando, então, a estrutura organizacional da
Administração Pública.

Quanto ao segundo questionamento, deve ser analisada a questão à
luz da impossibilidade de delegação do poder de polícia, de modo que um empregado
do consórcio não poderia ser nomeado como Autoridade Sanitária, em razão de não
preencher os requisitos necessários para a função. Entretanto, depreende-se a
possibilidade de contratação por meio de consórcio intermunicipal, de profissionais que
exerçam a função, exclusivamente, de oferecer suporte em caráter colaborativo a
Autoridade da Vigilância Sanitária, sem exercer o poder de polícia.

Por fim, em relação ao terceiro e último questionamento, inexiste
vedação acerca da possibilidade de um fiscal da Vigilância Sanitária atuar,
simultaneamente, em diversas áreas de fiscalização. Contudo, é importante estabelecer
as atribuições necessárias para cada tipo de vigilância.

Salvador/BA, 29 de junho de 2023

THIAGO LOPES CARDOSO CAMPOS
OAB/BA 23.824
Diretor Regional Nordeste IDISA


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